“Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre.” - Simone de Beauvoir.
Para entender a necessidade da existência de luta por igualdade de gênero é preciso compreender nossa sociedade como reprodutora de machismo em sua essência. O Brasil segundo o IBGE possui 51,8% de sua população reconhecidamente do gênero feminino, mas onde estão essas mulheres nos espaços de poder social?
De trinta e oito presidentes da república apenas uma mulher foi eleita para o cargo, Dilma Rousseff foi empossada em 1 de janeiro de 2011 e após reeleição em 2014, sofreu um golpe em agosto de 2016 não concluindo seu mandato. Fundado em 1829 o Supremo Tribunal Federal após 177 anos de existência em 2006 teve a primeira mulher presidindo o plenário da côrte a ministra Ellen Gracie Northfleet, 14 anos depois em outubro de 2020 a ministra Rosa Weber tornou-se a terceira mulher a presidir uma sessão no STF. Dados apresentados em 2020 pela revista Forbes apresentam que das dez pessoas mais ricas do Brasil somente uma é mulher ocupando a oitava posição Luiza Helena Trajano é responsável por comandar uma das maiores redes de loja varejistas do país. A primeira mulher parlamentar no Brasil foi a princesa Isabel, que ao completar 25 anos ascendeu em 1871 ao cargo de senadora, sendo Eunice Michiles a segunda mulher a ocupar o cargo e a primeira eleita ao senado apenas em 1979 ou seja 108 anos após a princesa Isabel.
Os dados supracitados são vitórias importantes para a luta da igualdade de gênero mas também nos mostra o quão ainda é resistente em nossa sociedade a presença das mulheres em espaços de poder, o capítulo I do livro “Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista” de Guacira Lopes Louro nos remete a essa reflexão do decorrer das lutas do movimento feminista por esses espaços de poder na politica, ciência, no ambiente profissional e na sociedade no geral, ela nos mostra o como é invisibilizado as questões de gênero e o quanto elas estão fortemente ligadas as desigualdades sociais.
Guacira no capitulo I “A emergência do gênero” diz que normalmente quando falamos de movimento feminista é comum remetemos as lutas do seculo XIX e lembrar das sufragistas que brigaram pelo direito ao voto, mas pouco se fala da “segunda onda” do feminismo com a expansão dele no mundo academico e cientifico. Guacira expõe no capítulo a importância da teorização do movimento justamente para elencar e buscar caminhos que resolvam questões importantes na luta por mais igualdades de gênero. Essa inserção das idéias feministas no meio científico encontrou muita resistência, justamente por esses espaços em maioria dos casos legitimar as ideias machistas perpetuadas em sociedade.
Por vários momentos houve tentativas de invalidar as ideias feministas na ciência a princípio por serem supostamente politizadas demais, mas não limitando-se a isso e os contrários buscavam também legitimar seus argumentos para a existência das desigualdades entre homens e mulheres baseando-se em aspectos biológicos, buscando comprovar a necessidade de papel feminino e masculino na sociedade. Mas Guacira diz que “não é negada a biologia, mas enfatizada, deliberadamente, a construção social e histórica produzida sobre as características biológicas” ou seja a ideia de gênero decorre de uma construção social, não biológica, e essa construção incide sobre corpos. E não apenas afetando a vida de mulheres cis heterossexuais mas também a vida de LGBTQIA+, pois dentro dessa logica binaria (masculino-feminino, dominar-dominado) se constroi esses papeis predeterminados para esses corpos e é latente como quem não se encaixa neles é oprimido na vida em sociedade, fazendo assim necessidade desses atores construirem uma força de resistencia.
Por fim, quando entendemos que a construção da ideia de gênero é histórica e compreendemos melhor como os discursos, as representações e as relações entre homens e mulheres mudaram no decorrer dos anos, é possível assim chegar a inferir que a ideia de identidade de gênero é fluida. No capítulo é citado uma fala de Teresa de Lauretis "a construção do gênero também se faz por meio de sua desconstrução" essa ideia é o que deve guiar aquele que anseia estudar sobre gênero e sexualidade, pois nossa sociedade nos moldou machistas e por isso é necessário desconstruir nossos comportamentos, algumas opressões são tão naturalizados que por vezes é praticado até por pessoas que são vítimas dessa opressão, é necessário um constante esforço para mudar o status quo. Guacira termina o capítulo nos alertando que “é indispensável admitir que até mesmo as teorias e as práticas feministas — com suas críticas aos discursos sobre gênero e suas propostas de desconstrução — estão construindo gênero”.
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